segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Simplesmente Ela



Ontem voltei completamente absorta pelo monólogo “Simplesmente eu, Clarice Lispector”; encenado, roteirizado e dirigido por Beth Goulart.

O cenário, a semelhança física, o texto, a fala ritmada, a iluminação.

A luz acende. Apaga. Quando vai reacendendo é como se abrisse uma sessão espírita (juro que não é deboche, ela realmente “incorpora”) e a atriz, de costas, levanta o braço com um cigarro aceso e o leva em direção a boca. Seu movimento é muito similar aos trejeitos da escritora. Arrepia.
O cenário parece contribuir para o clima de post-mortem. Seu fundo, formado de tiras brancas que, às vezes, pareciam prata ou cristal, remetia a um cenário “além da vida”.

Achei que a peça pudesse beirar a angústia, como sugeriu um amigo. Não era. A única angústia foi criada por um povo que não parava quieto e ficava desgrudando suas coxas de um couro antigo que balançava a cadeira e fazia: nhéc, nhéc, nhéc. Tenso.

O texto disseca Clarice, sua relação com a escrita e consigo mesmo. Em alguns momentos a atenção tem que ser excessiva, e você mergulha mentalmente palco adentro. São os trechos mais subjetivos, que precisariam ser lidos pelo expectador para serem melhor absorvidos. Mas é exatamente a necessidade da atenção excessiva que fornece o clima denso que caracteriza a obra.
A peça é um apanhado de trechos de textos e livros da escritora. Pelo trabalho, Beth Goulart recebeu o Prêmio Shell 2009 de melhor atriz. Nada mais justo.

Nenhum comentário: